sábado, 28 de maio de 2011

Aprendizagem ao longo da vida

Aquilo que somos hoje é o reflexo daquilo por que passamos e reflectir-se-á nos actos e atitudes do nosso futuro.
Quando em crianças, sentíamos fascínio e admiração por pessoas com conhecimentos acima da mediania que nos rodeavam; o professor, o médico, o advogado e pessoas que pouco mais estudaram para além da instrução primária ou mesmo não tendo passado disso, eram ouvidas com atenção, com respeito e as suas opiniões eram merecedoras de encómios mesmo que não merecessem total aprovação, não deixávamos de sonhar de um dia vir a ser também assim, de nos ser reconhecida alguma importância e de podermos contribuir para o bem, pelo menos, daquele núcleo da sociedade à nossa volta.
Se o sonho comanda a vida, também cedo aprenderíamos que muitos dos nossos sonhos iriam cair por terra e que a realidade seria até cruel, pois muitos dos sonhos de criança ou adolescente estavam dependentes, não só de nós, da nossa vontade, mas do projecto de vida que os ascendentes tinham para a nossa realização pessoal, projectos esses condicionados pelas tradições, seus pontos de vista, condições do meio e condições económicas ou outras.
Se o nosso percurso escolar não ia passar da instrução primária, começavam logo ali as agruras da dura realidade ao percebermos que aquele saber que tanto almejávamos é privilégio só de alguns, não porque são os mais dotados, os mais capazes de, no futuro, colocarem esse saber ministrado em seu proveito e da sociedade em geral, mas porque as suas famílias possuem capacidades económicas e lhes pretendem reservar um futuro mais promissor. Se o nosso meio era pobre, o acesso ao saber e à cultura estava distante e as possibilidades de conciliar o estudo com o trabalho eram impraticáveis (o conceito de trabalhador/estudante era quase inexistente), se o acesso aos livros nos era difícil, a possibilidade de alimentar a nossa fome de conhecimento para lá do que nos foi ministrado na escola primária estava muito dificultada. Como recurso tínhamos o jornal que vinha aos fins-de-semana e que era “devorado” da primeira à última letra, começando pelas mais gordas, depois das notícias mais ligeiras até aos acontecimentos mais importantes da política (o que a censura deixava passar) indo até ao último anúncio publicitário. Mais tarde, eram os artigos de opinião, as crónicas, os editoriais, os comentários que tinham a primazia.
Num meio onde as oportunidades de prosseguir uma carreira apoiada em alicerces mais sólidos e proporcionada pelo ensino eram tão escassas e só estavam ao alcance de alguns, o que restava à grande maioria era seguir a Universidade da Vida, ingressar numa carreira profissional mais ou menos aliciante, mais ou menos motivadora e procurar dela tirar o melhor proveito em benefício próprio e dos seus.
Nem todos se aguentavam. O baixíssimo nível de vida alicerçado nos parcos rendimentos do trabalho, na rigidez das leis e o controlo das populações por parte do estado, forçou muita gente a imigrar clandestinamente (ainda estão na memória de muita gente a “ida a salto” para França, principalmente, na década de 60 do século passado). Outros foram resistindo, permanecendo nas suas terras ou emigrando para outras partes do território à procura de melhores condições. Estas vicissitudes foram prodigiosos meios de aprendizagem, fortalecimento e, por certo, valorização do carácter pessoal. Houve ainda aqueles que por razões políticas e serem contrários à guerra colonial em que o país se encontrava envolvido, não encontraram outra opção que não “fugir” para o estrangeiro e, como os que partiam em busca de uma vida melhor, se sujeitaram a viver longe das suas famílias, dos seus amigos e da sua pátria.
Aos que por cá se aguentaram restou-lhes submeterem-se e adaptarem-se, uns melhor e outros pior, aos ditames das leis do país e extrair das suas experiências o melhor proveito possível. Uma fase muito rica das suas carreiras foi, sem dúvida, a vida militar. Rica em vários aspectos, mesmo os negativos, se pensarmos nos sacrifícios e perigos inerentes que correram numa guerra que ceifou muitas vidas de jovens, mas também muito rica positivamente pelas aprendizagens que proporcionou ao conhecermos novas terras, novas gentes, outras culturas, outros costumes, novas amizades, novos saberes e até pela disciplina que, mais ou menos aceite, nos foi imposta e que, por vezes, com mais ou menos arte se ia contornando, mas sobretudo pelos ensinamentos adquiridos e que permitiu a muitos, depois de terminado o serviço militar e regressarem à vida civil, optarem por novas carreiras profissionais. Não era por acaso que se dizia que para sermos homens tínhamos que ir para a tropa.
Depois desta passagem militar, mais maduros, mais aptos para enfrentar o futuro, novos desafios se colocavam. Embora muitos já estivessem casados antes do ingresso nas forças armadas, a grande maioria pertencia ao exército dos solteiros e novos desafios que antes não se colocavam pareciam agora mais prementes, aproximando-se a hora de constituir família e outras responsabilidades a que não estávamos habituados nos iriam ser impostas.
É encarando esta perspectiva que se tomaram opções balizadas nos conhecimentos e experiências vividas, que alguns partiram ao encontro de novas oportunidades na procura de meios para alcançar os seus fins, mesmo sem saber objectivamente quais eram.
Enfrentaram outros meios, outras gentes, novas profissões, conheceram novas amizades, adaptaram-se a novas realidades, conforme as exigências profissionais e a sua predisposição, procuraram, através do estudo, melhorar as suas aptidões procurando subir na carreira, casaram e constituíram família, quantos bem longe dos seus ambientes primitivos.
No seu dia-a-dia enfrentaram crises, alguns tiveram que deixar os seus empregos e seguir uma via empresarial, umas vezes com sucesso, outras nem tanto, mas sempre beneficiando da sua experiência de vida na tomada de decisões.
O progresso e a evolução tecnológica mudou muito os comportamentos da sociedade e essa mudança segue um ritmo cada vez mais veloz, pelo que os conhecimentos de hoje poderão ser insuficientes amanhã. Torna-se, por isso, necessário que juntemos aos nossos conhecimentos e aprendizagens, novos conhecimentos e novas aprendizagens, que mantenhamos sempre actualizado o nosso saber para não sermos ultrapassados pelos acontecimentos.

1 comentário:

  1. A aprendizagem ao longo da vida deve incluir, e nos dias de hoje por certo inclui, aprender a ver para além da crise, e aprenbder a ver para além daqueles que acrescentam crise à crise, nos querem fazer crer, da inevitabilidade dos cainhos únicos. O que é inevitável num dia pode deixar de o ser no dia seguinte. Vejamos o caso da crise nuclear do Japão, resultante do terramoto e do maremoto que se lhe seguiu. Antes daqueles acontecimentos era considerado inviável pela companhia eléctrica de Tóquio, dona da central de Fukushima, fazer os investimentos propostos pela agência internacional de energia nuclear, pois eram incomportáveis do ponto de vista económico. No "dia seguinte", o que se revelou inevitável, até do ponto de vista económico, era fazer os investimentos que reforçassem a segurança das instalações nucleares.
    A aprendizagem ao longo da vida, em especial aquela que decorre nos momentos de crise, exige a capacidade de prescrutar do futuro para o passado, vendo para além do ecrã translúcido, quando não opaco, das inevitabilidades actuais.

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