quinta-feira, 21 de novembro de 2019

TERRA DE SANTA MARIA

A TERRA DE SANTA MARIA era antigamente uma vasta região delimitada a Norte pelo rio Ave, que vai desde a sua nascente na serra da Cabreira, em Vieira do Minho, até ao Atlântico, em Vila do Conde, e a Sul pelo rio Caima, cuja nascente é na serra da Freita, indo desaguar no rio Vouga, junto a Sernada do Vouga. Pelo Este, os limites deste território eram o rio Arda, o qual nasce na União de Freguesias de Arouca e Burgo, indo entrar na margem esquerdo do Douro, em Pedorido, Castelo de Paiva, e o rio Sousa, que nasce em Friande, Felgueiras, desaguando na margem direita do mesmo Douro, na freguesia de Foz do Sousa, Gondomar. Pelo Oeste todo este território era banhado pelo Atlântico.
Mais tarde ao território que fica na margem direita do Douro passou a chamar-se Terra da Maia, compreendendo tudo o que fica entre o rio Douro e o rio Lima, de sul a norte, e o rio Sousa e o mar, de leste a oeste.
Esta denominação de Terra de Santa Maria, deu-se a partir da sua conquista aos mouros, nos séculos X e XI.
A povoação que deu início àquela que hoje se denomina de Santa Maria da Feira, ter-se-á iniciado com a fundação de uma colónia de galo-celtas, pelos anos 390 a.C., com o nome de Lancobriga ou Langobriga.
Presume-se que o chefe dessa colónia se chamasse Lanca, e dele tomou a povoação o nome. Na linguagem celta, Lancobriga significa povoação, ou cidade de Lanco.
Há porém quem ache a fundação desta povoação ainda mais remota, em 2084 a.C., e que o seu fundador foi Brigo, 4º rei de Hespanha, baseando-se unicamente na terminação briga, sem acrescentar qualquer outro facto por onde se prove tal antiguidade.
O que está provado é que briga é palavra céltica e que significa povoação, cidade, etc. Se briga, em alguns casos, indica povoação fundada por Brigo ou em sua honra; o que podia ser muitos anos depois da sua morte, na sua maior parte não exprime mais do que povoação ou cidade.
Também se afirma que a primitiva ocupação humana do sítio remonta à pré-história e que adquiriu relevância quando os Lusitanos lá ergueram um templo em honra da divindade Bandeve-Lugo Tuerœs.
A Feira era uma fortaleza militar e a tradição oral e escrita diz-nos que foram os mouros quem a fundou, mas o que parece não sofrer contestação é que quando estes chegaram ao local onde se encontra o castelo, já lá existia uma povoação, como o atestam inscrições romanas ali encontradas em 1912 e 1917, e ainda uma última em 1937, esta bastante deteriorada, não sendo, por isso, possível fazer a sua leitura. Estes achados parecem sugerir a existência de um templo; o que leva a crer que deveria o povoado ter uma certa importância. Depois a circunstância deste povoado estar no cimo de um outeiro; aliada à importância que forçosamente teria, faz-nos acreditar ter havido no local um castro ou castelo, para defensão dos moradores; o que induz que a fundação desta fortaleza seja obra dos romanos e não dos mouros, como refere a tradição.
Consta no manuscrito “Crónica dos Godos” que noticia a vitória de Bermudo III de Leão (1028-1037) sobre um chefe muçulmano em Terras de Santa Maria, uma referência a esta fortificação. Será deste período a construção da torre de menagem, com funções de alcáçova, protegida por uma cerca amuralhada, da qual apenas restam vestígios.
Como aconteceu em todas as povoações da Península, a Feira sofreu as consequências das constantes guerras da idade média, até que, cerca do século I, caiu em poder dos romanos, exaurida de forças, e quási reduzida a mulheres e crianças.
Porque os romanos achavam bárbara a terminação briga, esta foi latinizada em todas as povoações da Lusitânia, alterando-se para brica, e assim Lancobriga passou a chamar-se Lancobrica.
Próximo desta cidade passava a via militar romana, que de Mérida, então capital da Lusitânia, vinha a Conimbriga (Condeixa a Velha), Talábriga, Lancobriga; importante durante o domínio romano, e Cale (Gaia), e que conduzia até Bracara Augusta (Braga). Como era uma estrada necessitada com frequência de reparações nos pântanos por onde passava, tornando-se por isso muito dispendiosa, os árabes, no século IX, construíram uma nova via de Coimbra a Porto de Cale, pela cidade de Ӕminium (Águeda), seguindo um traçado muito idêntico ao da antiga estrada real, mais tarde estrada nacional 1, de Lisboa para o Porto, que durou muitos anos e também conhecida por estrada mourisca.
Pinho Leal situa Talábriga em Aveiro, mas também afirma que se diz que o seu primeiro assento “era onde hoje está a povoação de Cacia” no entanto tudo indica que esta povoação romana se situava em Cabeço do Vouga (Lamas do Vouga), na União de Freguesias de Trofa, Segadães e Lamas do Vouga, concelho de Águeda.
Por sua vez Lancobriga também não seria a povoação junto ao castelo da Feira, mas no Monte (Redondo) de Santa Maria (Castro de Fiães), freguesia de Fiães, no mesmo concelho de Santa Maria da Feira (cerca de 8 km da sede do concelho). Escavações efetuadas no local, em 1971, especialmente na área a nascente da capela de Nossa Senhora da Conceição, erguida aí mais tarde, permitiram colocar a descoberto uma zona bastante revolvida e algum espólio balizado cronologicamente entre os séculos IV e V dC, correspondendo a uma das fases de maior atividade registadas no sítio. Alguns indícios de fragmentos encontrados apontam para a construção inicial desta estação arqueológica em plena Idade do Ferro nesta região; a maioria dos artefactos encontrados aponta para o período relativo à ocupação romana. Sondagens efetuadas em 1980 permitiram localizar um troço da muralha erguida na primeira fase da ocupação do local, correspondente à idade do ferro.
Em O Arqueólogo Português – 1ª Série, Volume IV (1898), pág. 250, pode ler-se:
“219. Fiaes (Beira)
Sepulturas «mouriscas».
Freguesia de Santa Maria. Comenda da Feira. – «Algũas antiguidades se descobrem nesta freguesia como são as seguintes: No sitio da Capella da Senhora da Conceyção de que se faz memsam no interrogatório 13 se tem por virozimel ser povoação de Mouros; porque se achão pedaços de paredes de cantaria; muito tijolo, e muita cinza e carvões indicios de cozinhas. Algum dinheiro de cobre com figuras e outros crateres, cujos letreiros se não persebem e tambem se achou huma moeda de ouro do tamanho de hũa de dezasseis tostões.
Tambem se descobrem em outro oiteiro defronte da dita Capela enterrados debaxo da terra altura de dous palmos varias panellas e salgadeiras de barro vermelho, tapadas todas com louzas de pedra, todas com seus letreiros ao paresser de letra mourisca e dentro das tais panellas ossos e carvões, metais sem se saber que metal seja, pois tudo se acha quazi gasto; e dentro em alguns destes vazos se achavão copos de feytio de calis, e em hum se descobrirão mais de cincoenta vazos destes, de que hoje não ha nenhuns pois se quebrarão». (Tomo XV, fl. 411)”
No período do domínio romano e no princípio do gótico, Lancobriga pertencia ao bispado de Mérida. Ao ser criado o bispado de Coimbra, os godos retiraram do bispado de Mérida todo o território entre o Mondego e o Douro, e outras terras, para constituírem o novo bispado, ficando Lancobriga a pertencer ao bispado de Coimbra até 1195, passando então a ser do Porto.
Quando a Lusitânia foi invadida pelos povos do norte, Lancobriga ficou a pertencer aos Visigodos, vulgarmente designados Godos.
É muito provável que foram os godos os construtores do atual castelo, face à sua arquitetura e às suas seteiras em forma de cruz. As seteiras das fortalezas árabes eram em forma de um crescente.
Apresentando o castelo da Feira indícios de ser construção gótica, tal não quer dizer que foi construído nos três séculos do seu domínio na Península, uma vez que a arquitetura gótica sobreviveu por muitos séculos; no entanto supõe-se que quando os muçulmanos ocuparam a Feira, já o castelo existia.
Pensa-se que durante o domínio árabe, Lancobrica conservou o seu nome primitivo “Lancobriga”, não havendo provas do contrário.
À medida que os cristãos foram conquistando território aos árabes e tendo já conquistado toda a província do Minho até ao Porto, Afonso III de Leão concedeu aos seus cavaleiros todas as terras que resgatassem a sul do Douro, criando uma região administrativa e militar denominada Terras de Santa Maria, sendo a sua chefia numa fortaleza existente em Santa Maria da Feira, a Civitas Sanctӕ Mariӕ, que funcionou como base avançada da reconquista cristã e sentinela contra as invasões árabes vindas do sul. Esta região abrangia todo o território conquistado desde o rio Arda até ao mar e do rio Douro até ao rio Caima.
Em 990, no reinado de D. Bermudo II de Castela, o Gotoso, os condes Mem Guterres e Mem Lucídio, juntamente com os senhores do Marnel, estando a então Lancobriga abandonada e muito destruída, a reedificaram e povoaram de cristãos, reedificando também o seu castelo, estrutura importante, naquele tempo, para a sua defensão.
Na Corografia Portuguesa, sobre Vila da Feira, se diz:
T R A T A D O IV, Da Comarca, & Ouvidoria da Feira. C A P I T V L O I. Da descrição da Vila da Feira. CINCO léguas da Cidade do Porto para a parte do Sul, e duas do mar Oceano para o Nascente, entre os dois celebrados rios Douro & Mondego, quási em igual distância de um e outro, em um ameno e salutífero Vale tem seu assento a nobre Vila da Feira, que povoaram pelos anos de 990. O Duque Mem Guterres e o Conde Mem Lucídio, juntamente com os senhores de Marnel, todos mui chegados em parentesco aos Reis de Leão, donde se chamaram Infanções antigos de Santa Maria, como se chama toda esta terra, de que foram senhores os Condes da Feira, que por muitos anos moraram no seu Castelo, que está em lugar iminente e foi fundação dos Mouros. (…) É esta Vila abundante de todos os frutos, caça, gado, carne de porco, linho, lenha e de regalado peixe. Assistem ao seu governo civil um Ouvidor Letrado, que apresentavam os Condes desta Vila, três Vereadores, um Procurador do Concelho, Escrivão da Câmara, um Juiz dos Órfãos com seu Escrivão e Porteiro, quatro Tabeliães do Judicial e Notas, Distribuidor, Inquiridor e Contador, um Meirinho, um Alcaide, e é da Provedoria de Esgueira. Ao militar hum Capitão-mor e Sargento-mor com treze Companhias da Ordenança da Vila e seu termo, que é mui dilatado…”
É esta a versão mais corrente, mas há quem afirme existir um documento de 897 em que aparece Mem Guterres como pai de Enderquina Pala e que Mem Lucídio figura em documentos de 1014 a 1050. Assim sendo, é impossível que juntos cometessem tal empreendimento. O mais provável é ter havido duas reedificações e não uma só.
O lendário guerreiro árabe Almançor, no ano 1000, por duas vezes invadiu a região, conquistou o castelo e arrasou a povoação, voltando sempre a ser reconquistada e reconstruída pelos cristãos, mantendo o seu nome de Civitas Sanctӕ Mariӕ.
Esta região foi de novo invadida no reinado de Bermudo III (1028-1037), mas foram os mouros desbaratados na batalha de Cesar, povoação que ainda hoje mantém esse nome e é freguesia do concelho de Oliveira de Azeméis. Também aqui há controvérsia, pois há quem aponte como data desta batalha o ano de 1045, mais exatamente a 10 de abril. O que parece certo é que Bermudo III faleceu em1037.
Durante muito tempo a Terra de Santa Maria foi zona de fronteira com os árabes. Depois da conquista de Coimbra (1064 ou1067), por Fernando I de Leão, o Magno, funcionou como “viveiro” de cavaleiros e peões que alimentava as tropas da frente sul, só possível pelo carácter permanente da organização militar instalada na Terra de Santa Maria.
Os descendentes de Mem Lucídio, de Mem Guterres e dos senhores do Marnel, ganharam o nobre título de infanções de Santa Maria, título inferior ao de rico-homem, equivalente a escudeiro, fidalgo que regia terras ou era guarda de castelos. Título que se atribuía aos filhos segundos e capitães das tropas dos Infantes, assim como se dizem Infantes aos filhos segundos dos reis.
No Portugal Antigo e Moderno, Volume Segundo, (pág. 351) se diz que o moçárabe D. Sisnando:
«Desgostoso com o emir (de Sevilha) entrou ao serviço de Fernando Magno, rei de Leão e Castella, e tanto se distinguiu pela sua intelligencia e bravura, que D. Fernando o fez conde (governador) das terras portuguesas ao sul do Douro, ás quais serviam de limite, pelo E. a linha de Lamego, Viseu e Cea, e de fronteira pelo SE. a vertente N. da serra da Estrella, cujo território formava então o condado de Coimbra.
Era também senhor das Terras de Santa Maria (hoje Terra da Feira).»
A Terra de Santa Maria era tida em tanta conta pelos reis de Castela e pelos primeiros Reis de Portugal, que todo o cavaleiro ali nascido tinha foros e privilégios de infanção e todos os peões tinham foro de cavaleiros. Os primeiros infanções que houve em Portugal foram os da Terra de Santa Maria.
Quando, em 1093, o conde D. Henrique tomou posse de Condado Portucalense, confirmou todos os foros e privilégios da Terra de Santa Maria e lhe deu foral em 1109, em que dava a esta povoação o título de vila. Este foral vem mencionado nas inquirições tiradas no mês de agosto de 1251.
Com a morte do conde D. Henrique, senhor do condado Portucalense, passou este a ser governado pela viúva D. Teresa, a qual se deixou envolver pelo fidalgo galego, Fernão Peres de Trava, que por sua vez estava ao serviço do arcebispo de Compostela D. Diogo Gelmires, assumindo na prática este Fernão Peres de Trava o governo do condado. Era intenção de D. Diogo Gelmires submeter o Condado Portucalense. Pouco a pouco a pequena burguesia portucalense foi sendo substituída por gentes da Galiza. Mais tarde este ataque económico e administrativo estendeu-se aos grandes senhores de terras e de poder, quer norte, quer a sul do Douro. As famílias Moniz: Ermígio, Mendo e Egas (de Riba Douro), Sousas (da Maia), Nuno Soares (de Grijó) e a família de Pero Gonçalves (do Marnel), famílias com vastas propriedades, quer no Alto Minho e Lamego, quer na Terra de Santa Maria, viram-se confrontadas com a ameaça de perderem cargos, prestígio e bens, em função de uma campanha, primeiro subtil e depois frontal, orquestrada do exterior.
Destas famílias tiveram destaque dois nomes: Ermígio Moniz e Pero Gonçalves do Marnel.
O primeiro era alcaide do castelo de Neiva ao tempo da revolta, mas antes tinha sido afastado do governo da Terra de Santa Maria e de alcaide do castelo. Era figura muito próxima do infante D. Afonso Henriques e irmão do célebre Egas Moniz, que também tinha sido afastado da Terra de Lamego. O segundo, Pero G. de Marnel, tinha sido substituído no governo de Coimbra pelo próprio Fernão Peres de Trava, e ao tempo da revolta (1127/1128) era governador da Terra de Santa Maria e alcaide do castelo. Fernão Peres de Trava passava assim a ocupar o governo de dois polos fundamentais do Condado Portucalense – o de Portucale e o de Coimbra.
A este movimento de revolta esteve ligado o infante D. Afonso Henriques, que também não via com bons olhos a situação e começava a temer o futuro que lhe estava a ser reservado.
Foi neste espaço geográfico delimitado por acidentes naturais muito fortes, que se desenvolveu um espaço económico muito importante, vivendo numa grande complementaridade de subsistência: as serranias davam-lhe a caça, a pastorícia e abundância de madeira. Os rios que a atravessavam e a extensa orla marítima, asseguravam-lhe a pesca. Nas planícies que se estendiam de leste para o mar era o cultivo de cereais e do vinho. Uma próspera zona de extração de sal garantia este elemento indispensável à conservação dos alimentos. A par disto, uma notável rede viária assegurava um comércio intenso num local de passagem obrigatório entre Coimbra e o Porto. Junto ao Castelo, a realização de grandes feiras comerciais acabou por dar o nome à povoação: Feira (já em 1117).
 Era um espaço militar muito forte apoiado numa organização militar permanente para defesa contra as incursões árabes e também um espaço cultural servido por dezenas de cenóbios e pelos grandes mosteiros de Grijó e de Pedroso, institutos religiosos que davam àquelas gentes, para além de um esquema de valores cristãos, a possibilidade de funcionarem como centros administrativos para a redação de documentos. Tudo isto, acabou por gerar um clima de "autossuficiência de vida" e "uma identidade peculiar", de que algumas linhas mestras perduram até aos nossos dias.
Esta pujança da sua vida económica, o poderio da sua força militar organizada e o estímulo do sentimento de independência, acabaram por desempenhar um papel decisivo na formação e consolidação da nacionalidade portuguesa com o levantamento coletivo que teve o seu epílogo na batalha de S. Mamede, em 1128. Os homens de Santa Maria avançaram para Guimarães – então capital de poder político – onde o infante D. Afonso já se encontrava a mobilizar as gentes daqueles sítios. Para lá se dirigiu, a norte do Douro e a partir do castelo de Neiva Ermígio Moniz.
Em socorro de Guimarães partiu Fernão Peres de Trava com as suas tropas, reforçado com as tropas galegas que se lhe juntaram no castelo de Lanhoso.
As forças em confronto defrontaram-se a 13 (ou 24?) de junho de 1128, saindo as forças portuguesas vencedoras. Esta batalha foi um marco indiscutível da nossa história, na sequência de um movimento independentista coletivo, abrangendo uma grande área de condado, quer a norte, quer a sul do Douro. Foi a tentativa galega de extinguir rapidamente este movimento latente, que acabou por precipitar a mesma independência. A grande importância que tiveram neste movimento militar as duas personagens fortemente ligadas à Terra e ao Castelo de Santa Maria: Pero Gonçalves de Marnel e Ermígio Moniz, é evidenciada por Alexandre Herculano (História de Portugal, 8ª edição, tomo II, livro I e II, 1ª parte, pág. 265-BNP) quando refere a carta de couto de S. Vicente de Fragoso, dado pelo infante (D. Afonso) a 4 de dezembro de 1127, “Há nele a circunstância de figurar entre os confirmantes Ermígio Moniz, o célebre conde ou senhor da terra da Feira e o personagem talvez mais influente na revolução do ano seguinte.”
A Terra de Santa Maria pode ser considerada como uma região que, no caso de ter estabelecido uma ligação preferencial a Coimbra, teoricamente teria inviabilizado a construção de um novo Reino. Associando-se a Portucale e garantindo o seu prolongamento em direção à mesma cidade de Coimbra, acabou por constituir o elo de ligação com ela. Por isto, bem pode dizer-se que a Terra de Santa Maria é a TERRA MÃE DE PORTUGAL.
É a partir daqui que Afonso Henriques se intitula rei de Portugal, vindo a sua independência a ser confirmada mais tarde pelos reis de Espanha e pelo papa.
Há, com data de 1 de junho de 1212, foral velho de D. Afonso II, que dá a Canedo (atual freguesia do concelho) o título de vila.
D. Afonso III concedeu foral à Feira em 1270, e D. Manuel I lhe deu novo foral a 10 de fevereiro de 1514. Este foral abrangia não só a vila, mas diversas povoações, e o seu título é: Foral das Terras de Santa Maria.
Sobre o castelo da Feira consta também que D. Dinis o doou à rainha Santa Isabel. As desavenças entre o rei D. Dinis e o infante herdeiro D. Afonso, aquando da sua revolta por causa do coirmão Afonso Sanches, levaram a que D. Afonso, entre outros, tomasse o castelo da Feira em 1322, sendo na altura alcaide-mor Gonçalo Rodrigues de Freitas. Com a intervenção da rainha-mãe, estas desavenças entre pai e filho foram sanadas com o juramento de lealdade do infante perante a mãe e muitos fidalgos, em Pombal, e depois, em maio de 1323, em Leiria, D. Dinis jurou aceitar as condições do juramento anteriormente feito. No Portugal Antigo e Moderno, Volume Segundo, pág. 236, o autor afirma que estas desavenças foram sanadas em Santarém, a 25 de fevereiro de 1325.
D. Fernando I fez mercê da Terra de Santa Maria ao irmão de D. Leonor de Teles, o conde de Barcelos, D. Afonso Tello. Após a morte de D. Fernando, este apoderou-se do castelo mas foi vencido por D. Gonçalo Coutinho, que se encontrava ao serviço do mestre de Avis. Mais tarde o mestre de Avis, já D. João I, rei de Portugal, fez mercê do castelo ao seu camareiro-mor João Rodrigues de Sá, depois confirmada a seu filho Fernão de Sá, por D. Duarte. Como Afonso Tello estava por Castela, D. João I doou todas as terras que lhe pertenciam (Terra de Santa Maria), a Fernão Pereira. Assim, na altura da doação, o domínio do castelo ficou separado do domínio das terras de Santa Maria. A posse do castelo era mais honorífica que de proveito e, por isso, a família Sá se foi desinteressando dele, deixando-o chegar a um estado de abandono. Perante isto Fernão Pereira terá instado D. Afonso V no sentido de o recuperar à sua própria custa, o que foi feito.
À criação do Condado da Feira foi atribuída a data de 14 de janeiro de 1452, por D. Afonso V, mas ao que parece tal não terá sido assim, pois Rui Pereira, depois D. Rodrigo Pereira 1º conde da Feira, teria então entre 21 e 24 anos, sendo ainda menor e estando ainda vivo seu pai, Fernão Pereira, senhor da Terra de Santa Maria. Não se encontra o registo da atribuição deste título, mas há uma primeira referência ao conde D. Rodrigo Pereira no alvará de 16 de maio de 1481, ainda em vida de D. Afonso V, alvará registado na Chancelaria de D. João II, livro 3º, folhas 43 v.
Uma outra versão nos diz que D. Afonso V entregou, em 1448, o castelo da Feira a Fernão Pereira, com a incumbência de o restaurar, sendo dessa época a imagem arquitetónica que apresenta hoje, e cerca de 24 anos depois, em 12 de janeiro de 1472, nomeou a Rui Pereira (depois D. Rodrigo Pereira) como 1º conde da Feira e senhor da Terra de Santa Maria. Ficam aqui estas duas versões até que as dúvidas se esclareçam.
A família dos Pereiras era o ramo primogénito do conde Mem Guterres, de sangue godo, e foram donatários da Feira. O castelo conservou-se na posse da família até ao falecimento do oitavo e último conde, pois este não deixou sucessão. D. Pedro II integrou-o nos bens da Casa do Infantado com as suas terras anexas, os quais, a seguir ao triunfo da monarquia liberal, foram vendidos em hasta pública (1837). A partir daqui entrou o castelo num período de abandono. Mais tarde, em 1881, foi classificado como monumento nacional.
Apesar de tudo, durante o período em que esteve votado ao abandono pelas autoridades, foi recebendo algumas benfeitorias de privados que se interessaram pela sua conservação, evitando-se a sua ruina completa.
Foram condes da Feira:
1º Conde – Rui Pereira – D. Rodrigo Pereira (1428-31†1486): 2º Conde – D. Diogo Pereira (1457-61 † 17/7/1509); 3º Conde – D. Manuel Pereira (1488 † 4/10/1552); 4º Conde – D. Diogo Forjaz Pereira (1514 † 26/11/1578); 5º Conde – D. João Forjaz Pereira (1563? † 15/5/1608); 6ºs Condes – D. Joana Forjaz Pereira de Meneses e Silva (1607 † ?) D. Manuel Forjaz Pereira Pimentel (? † ?/6/1647); 7º Conde – D. João Forjaz Pereira Pimentel (1628 † 4/6/1660); 8º Conde – D. Fernando Forjaz Pereira Pimentel (1629 † 15/1/1700).
O condado da Feira era um dos maiores e melhores de Portugal, dado que abrangia toda a Terra de Santa Maria, já então chamado vulgarmente Terra da Feira, embora oficialmente fosse, até 1834, Terra de Santa Maria.
A comarca da Feira chegou a ser uma das maiores do país. Uma parte pertenceu à correição de Barcelos e a outra parte à de Esgueira, passando depois toda para esta última, e mais tarde para a de Aveiro, pela transferência de corregedoria de Esgueira para Aveiro. Por fim formou uma corregedoria própria.
No recenseamento geral da população portuguesa, ordenado por D. João III, em 1527, a Vila da Feira com o seu termo pertencia à Comarca (hoje dir-se-ia Província) da Estremadura, e não da Beira.
Em 1834, a comarca de Feira tinha noventa e seis freguesias, algumas delas com mais de mil fogos. As comarcas de Oliveira de Azeméis, Estarreja e Ovar, foram formadas exclusivamente com freguesias da comarca da Feira, e Arouca absorveu as freguesias de S. Miguel do Mato, Fermedo, Escariz a Mançores.
A 7 de agosto de 1834, travou-se a batalha de Souto Redondo, no lugar do mesmo nome, no sítio denominado Airas, S. João de Ver, Feira, já nos finais das Guerras Liberais. Batalha travada entre as tropas liberais afetas a D. Pedro IV e as forças absolutistas de seu irmão D. Miguel. Nesta batalha o exército absolutista, comandado pelo general Póvoas, desbaratou completamente as tropas liberais, comandadas pelo conde e marquês de Vila Flor, mais tarde duque da Terceira, o general António José de Sousa Manuel de Meneses Severim de Noronha. Mas como perder uma batalha, não significa perder a guerra, esta Guerra Civil Portuguesa, que durou de 1828 a 1834, travada entre constitucionalistas e absolutistas sobre a sucessão real, terminou com a vitória dos constitucionais liderados pela rainha D. Maria II, com o apoio de seu pai D. Pedro.
Em Santa Maria da Feira esteve instalado, até 1834, o quartel do Batalhão de Caçadores nº 11, cujas tropas combateram nesta batalha ao lado das tropas miguelistas, para além de um regimento de milícias, capitão-mor, uma companhia de ordenanças, na vila, e mais sete no concelho.
Celebra-se em Santa Maria de Feira, a 20 de janeiro, a festa de S. Sebastião, também designada, festa das fogaças ou fogaceiras. Fogaças é uma espécie de pão doce e fogaceiras as meninas que os transportam.
Esta festa foi instituída por ocasião de uma peste que assolou todo o país, em 1500. Provavelmente foi a câmara e o povo que principiaram esta festa, como prece ao santo pela cura desta moléstia, porém, dizem também que foram os alcaides-mores que deram início a esta celebração. No entanto é tradição que foi intenção dos condes da Feira e que a peste cessou no dia em que se fez a festa, passando esta a ser realizada anualmente até hoje.
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O concelho de Santa Maria da Feira é um território economicamente muito dinâmico e de elevada densidade populacional, superior à média nacional e às regiões Norte e Centro, por virtude de um elevado grau de industrialização e proximidade à área do Grande Porto. Situa-se a sul da Área Metropolitana do Porto e na confluência de um importante conjunto de vias de comunicação, que garantem proximidade aos centros urbanos do Porto, Aveiro e Coimbra. Anteriormente Vila da Feira, com a sua elevação a cidade, em 14 de agosto de 1985, passou designar-se Santa Maria da Feira.
Pelo Censos da População de 2011, o concelho, com uma área de 213,45Km2, tinha 138.312 habitantes, sendo 18.194 os habitantes na cidade sede do concelho (União de Freguesias de Santa Maria da Feira, Travanca, Sanfins e Espargo).
Para além da sede, o concelho inclui mais duas cidades: Fiães e Lourosa; 12 vilas: Argoncilhe, Arrifana, Canedo, S. Tiago de Lobão, Mozelos, Nogueira da Regedoura, Paços de Brandão, Rio Meão, Santa Maria de Lamas, S. Paio de Oleiros e Souto.
O concelho de Santa Maria da Feira engloba um total de 21 freguesias: Argoncilhe; Arrifana; Escapães; Fiães; Fornos; Lourosa; Milheirós de Poiares; Mozelos; Nogueira da Regedoura; Paços de Brandão; Rio Meão; Romariz; Sanguedo; Santa Maria de Lamas; S. João de Ver; S. Paio de Oleiros; União de Freguesia de Caldas de S. Jorge e Pigeiros; União de Freguesias de Canedo, Vale e Vila Maior; União de Freguesias de Lobão, Gião Louredo e Guisande; União de Freguesias de Santa Maria da Feira, Travanca, Sanfins e Espargo; União de Freguesias de S. Miguel de Souto e Mosteirô.
O maior centro mundial de transformação de cortiça e a maior concentração nacional da indústria do calçado, encontram-se no concelho de Santa Maria da Feira, destacando-se também nas indústrias de metalomecânica, metalurgia, papel, cerâmica, lacticínios, puericultura, brinquedos e equipamentos para crianças.
Em termos turísticos, há em Santa Maria da Feira importantes motivos de natureza monumental e paisagística: destaque para o seu Castelo, exemplar da arquitetura medieval; as Termas das Caldas de S. Jorge, uma das melhores estâncias termais do país; o Museu Convento dos Loios; o Museu do Papel de Santa Maria e o Castro de Romariz.
Destaque especial para o complexo do Europarque e Visionarium, o Museu de Santa Maria de Lamas e Parque Ornitológico de Lourosa – Zoo de Lourosa, que reúne fauna proveniente dos cinco continentes e muitas espécies raras em vias de extinção, devidamente integradas no seu habitat natural.
Passa também este concelho pela forte aposta em atividades de interesse turístico-cultural: são exemplos a Festa das Fogaceiras, o Imaginárius – Festival Internacional de Teatro de Rua, com destaque espacial para a Viagem Medieval em Terra de Santa Maria, na qual se recriam espaços e episódios históricos da época.
Ordenação heráldica do brasão e bandeira:
Armas - Escudo de azul, castelo de prata lavrado de negro, aberto e iluminado de vermelho, quadrado, em perspetiva, com os ângulos exteriores formados por quatro torreões cobertos de cinco cones, sendo o maior o do centro. O centro do castelo é encimado por nuvens de prata, realçadas de azul, que sustêm uma imagem de Nossa Senhora com o Menino ao colo, vestida de vermelho, com manto de azul e resplendor de ouro. Coroa mural de cinco torres de prata. Listel branco com a legenda de negro: " SANTA MARIA DA FEIRA ".

Estandarte - Esquartelado de branco e vermelho, cordões e borlas de prata e vermelho. Haste e lança de ouro.
Referências:
Leal, Pinho – Portugal Antigo e Moderno – Volume Terceiro, págs. 153 a 158.
Costa, P.de António Carvalho da – Corografia Portuguesa, Tomo II, págs. 164 a 174.
http://ww3.aeje.pt/avcultur/Avcultur/ArkivDtA/Vol04/Vol04p141.htm
http://fortalezas.org/index.php?ct=fortaleza&id_fortaleza=1140
http://ww3.aeje.pt/avcultur/Avcultur/ArkivDtA/Vol19/Vol19p081.htm
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