segunda-feira, 21 de setembro de 2015

HOMO SACER E A VIDA NUA (Giorgio Agamben)


Segundo Giorgio Agamben, «bando» é o meio no qual e pelo qual se estabelece a relação de “pertença” como fundamento das comunidades políticas. O bando é o grupo ou corpo social relativamente ao qual nos encontramos numa relação de inclusão, de pertença ao bando, dele participando e da sua estrutura de soberania baseada num poder instituinte na lei e nos mecanismo para a fazer cumprir.
Ainda segundo Agamben, a modernidade leva a cabo a politização da vida criando, através de tecnologias apropriadas, “os corpos dóceis” de que tem necessidade e em que, num maior ou menor grau, nos tornámos e que fazem parte, por sua vez, do corpo da nação, relativamente ao qual nos encontramos numa relação de inclusão. Os que estão dentro do espaço ou zona da lei participam do bando e da sua estrutura de soberania baseada no poder da lei instituinte e nos mecanismos para a fazer cumprir. Por outro lado, o indivíduo excluído é aquele que se encontra excluído do bando e se encontra, por isso, excluído da cidadania e do âmbito do direito, sujeito a um estado de exceção. Sustenta Agamben que o estado de exceção “juridicamente vazio” ultrapassou os seus limites e tende a coincidir com a ordem natural, na qual tudo se torna novamente possível. Para Agamben isto é um paradoxo, pois o estado de exceção pretende que é impossível distinguir, nele, a transgressão da lei da sua execução.
Abandonado     – deixado à sua sorte, marginalizado.
Banido                 – posto à margem, excluído, expulso, desterrado.
Bandido               – fora da lei, malfeitor, antissocial.
Debandada        – fuga ordenada, êxodo, partida, saída, abandono, autoexclusão.
 Vida nua” designa uma vida que separada do seu contexto e tendo sobrevivido à morte, é incompatível com o mundo humano, não podendo em nenhum caso habitar a cidade dos homens. Serve para designar toda a vida humana que é incluída na ordem jurídica apenas sob a forma de exclusão; o homem sagrado (no sentido negativo), «homo sacer»; aquele que foi julgado por um crime, o homem mau ou impuro. O estado de natureza em que os homens viviam, o estado sem regras anterior ao da civilização segundo Hobbes, era um estado de exceção; segundo Agamben, volta a ser possível no estado de exceção.
O homo sacer tem a sua origem na vida primitiva dos povos indo-judeus, segundo Jhering, que foi o primeiro autor a aproximar a figura do homo sacer do wargus, o homem-lobo, e do friedlos, o “sem paz” do antigo direito germânico; wargus significava igualmente, para além de homem-lobo, bandido, fora da lei. Ao longo dos tempos o bandido foi associado a um lobisomem, ao homem que foi banido da comunidade dos homens e retorna ao estado de natureza, «um monstro híbrido, entre o humano e fera, dividido entre a selva e a cidade».
Platão, no livro VIII da República destaca a condição do soberano, mais concretamente a proximidade entre o tirano e o homem-lobo, aquando da transformação do protetor em tirano; «Porventura não é também assim que aquele que está à frente de povo e que, apanhando a multidão a obedecer-lhe, não se abstém do sangue da sua tribo (…). Acaso para um homem assim não é forçoso, depois disto, e fatal, que pereça às mãos dos seus inimigos ou que se torne um tirano, transformando-se de homem em lobo? – É absolutamente forçoso.»
O entendimento de que o homem é o lobo do homem, com o não reconhecimento da sobrevivência do estado natureza no estado de exceção, condenam a democracia à impotência face aos perigos que a espreitam e, sob múltiplas formas de desregulação da vida social, da económica à mediática, os instintos ferinos e o estado selvagem ameaçam ardilosamente a convivência democrática das comunidades humanas, impondo-lhes um cerco e um lugar de fuga que àquelas convenha, o campo, esta fuga em frente na direção de regimes pós-democráticos torna «vã qualquer tentativa de fundar as liberdades políticas nos direitos dos cidadãos», vivendo-se cada vez mais num estado de exceção que o condena cada vez mais à condição de homo sacer.
Há assim no bando os excluídos, os que vivem o estado de exceção, a vida nua, que se agrupam ou são reunidos no campo. (As prisões, os bairros sociais, os condomínios fechados, entre outros, ou até mesmo as diversas organizações de classe criadas dentro da sociedade).
A sociedade, o bando, ao qual os que dela fazem parte e participam da sua estrutura de soberania, das leis e dos mecanismos para obrigar ao seu cumprimento, tende a criar hierarquias (classes) sociais, grupos de exclusão, campos, e os que são relegados para o fim da escala hierárquica são os mais estigmatizados. Acresce ainda que os que vivem nesses campos, por exemplo, nos bairros sociais, criam grupos entre si que se conflituam, degradando-se ainda mais e aumentando a exclusão social.
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As comunidades de imigrantes fazem parte do nosso dia-a-dia, mas muitas vezes são ignoradas por uma grande parte da sociedade portuguesa que não vê com bons olhos a entrada de cidadãos de outros países, chegando a acusá-los de serem os causadores de grande parte do desemprego.
O crescimento do fenómeno da migração levanta problemas para os quais a sociedade portuguesa não está preparada e aos quais se somam os problemas resultantes da alteração do tecido social e cultural desta migração. A migração será uma realidade no nosso país e deve ser encarada de uma forma positiva, de enriquecimento humano, social, cultural e económico e até demográfico. O Estado deve promover a inclusão dessas comunidades na sociedade, no âmbito do sistema educativo, apoio social de inserção, combate à migração ilegal, entre outras. Contudo, com a crise económica global e num país em receção, a migração/imigração ilegal conduz à exploração de mão-de-obra barata, emprego precário, falta de condições de trabalho, ausência de segurança social e a forma como os média tratam a informação sobre os estes fenómenos associada à mentalidade muitas vezes xenófoba e racista, são fatores de exclusão.
Assim, parece não ser grande partilha de identidade entre portugueses e migrantes/imigrantes. A comunicação social não tem contribuído muito para essa partilha ao dar um enfoque especial a notícias de assaltos, roubos, prostituição, etc. quando os intervenientes são oriundos de outros países ou seus descendentes, aumentando o sentimento de insegurança e contribuindo para o aumento de sentimentos xenófobos e racistas.

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