Querer é poder. Todos os homens são capazes de compreender virtualmente o que os outros fizeram e compreenderam.
É possível aprender sozinho e sem mestre explicador quando se quer, seja pela contingência da situação ou pela tensão do próprio desejo.
Não é por certo o caminho mais célere para se chegar ao conhecimento, mas a inteligência com a qual aprendemos a língua materna, pela observação, retenção e repetição, verificando e relacionando as nossas buscas com o já conhecido, fazendo e refletindo, também nos pode levar a atingir aos nossos objetivos desde que para isso tenhamos vontade. E é também através da leitura, procurando compreender o que os textos dizem, interpretando e refletindo que podemos aumentar os nossos conhecimentos.
Por vezes será benéfico que o mestre se retire, deixe que a inteligência dos alunos enfrente a do livro, libertando as duas faculdades em jogo no ato de aprender: a inteligência e a vontade, estabelecendo entre o professor e o aluno uma relação de vontades que tem consequentemente uma relação livre da inteligência do aluno com a inteligência do livro, o vínculo intelectual igualitário entre o mestre e o aluno. Dispositivo que permite distinguir as várias categorias do ato pedagógico e definir o embrutecimento explicador, porque existe embrutecimento quando uma inteligência está subordinada a outra inteligência. No ato de ensinar e aprender, existem duas vontades e duas inteligências e chamaremos embrutecimento à sua coincidência. Porém, quando o aluno se liga à vontade do mestre e a uma inteligência, a do livro, a esta diferença conhecida e mantida das duas relações chamaremos emancipação, o ato de uma inteligência que não obedece senão a si própria, tornando possível aprender o que se ignora emancipando o aluno obrigando-o a usar a sua própria inteligência. A inteligência do mestre apenas se fará notar se for útil em si mesma. Para emancipar um ignorante é preciso e basta que este esteja consciente do verdadeiro poder do espírito humano, aprendendo sozinho o que o mestre ignora, se o mestre acreditar que pode e o obrigar a atualizar a sua capacidade: a relação homóloga do círculo da impotência que une o aluno a um professor do velho método, com uma relação de forças bem particular. O círculo da impotência está sempre presente, é o próprio movimento do mundo social dissimulado na diferença entre a ignorância e a ciência. O círculo da potência só pode ter efeito a partir da sua divulgação, ao aparecer como uma repetição ou um absurdo. “Os excluídos do mundo da inteligência subscrevem eles próprios o veredicto da sua própria exclusão. Resumindo, o círculo da emancipação deve ser começado”.