Não
é fácil fazer um levantamento de expressões ou vocábulos característicos desta
ou daquela região, porque se nela (região) estamos inseridos, eles nos são tão
familiares que passam despercebidos, pelo que só quem viaja e contacta com
alguma frequência com o povo de outras regiões, poderá ter uma percepção das
diferenças no seu linguajar.
De
qualquer maneira, os vocábulos ou expressões do norte, do centro, do sul, do
madeirense ou do açoriano; minhoto, transmontano, beirão, alentejano ou
algarvio, são formas muito características do nosso digníssimo falar português
e, realçando a peculiar troca dos Vês pelos Bês do povo do norte, não me parece
que se fale assim tão mal como por vezes se quer fazer crer.
Acho
até natural que este nosso polifónico verbo português sofra alguns atropelos
por parte dos menos letrados, o que não concebo é que os maus exemplos,
contrariamente ao que seria expectável, como hoje se diz, venham de cima, dos
que se consideram «instruídos»; de quem tem a missão de dirigir, ensinar, corrigir e informar.
Quase diariamente se ouve nos noticiários das rádios e televisões e se lê nos
jornais, relatos de acidentes de viação ou de aviação, de atentados bombistas,
naufrágios, catástrofes, etc., onde se “fazem” mortos e feridos; de senhoras a
quem lhes esticaram a dizerem-nos que “fizeram” uma plástica; na rádio e
televisão, quando se referem à idade de uma pessoa, por exemplo, dizem que tem
“vintanos”, “vintissetanos” ou “vintoito” ou “vintinovianos”, em vez de “pode
levá-la” preferem o “pode a levar” e então lá vai o “podiá levar”, o “que
atinge” passa a o “catinge”, o “também” agora virou “támém” e o médico de
família a quem me queixo quando algo não está bem com a minha saúde, já por
diversas vezes me mandou “fazer” análises, e eu por diversas vezes lhe disse
que não estou habilitado para isso e que tenho que recorrer a alguém que as
faça.
O
país está numa profunda crise, os índices de produtividade, dizem, são baixos,
no entanto pelo que se ouve, qualquer um “faz” cirurgias, “faz” ginásios, “faz”
piscinas, “faz” cursos, “faz” mestrados ou doutoramentos, etc. A autoestrada de
Lisboa ao Porto (A1) já tem sido “feita” inúmeras vezes, e por várias pessoas,
com a rapidez incrível de algumas horas, no entanto durante muitos anos só
existiu esta e, desde há alguns anos até agora só se viu mais uma e repartida
em vários troços, A8, A17, A25 e A29. Como resultado destas “feituras” têm sido
muitos os acidentes provocaram (não feitos), muitos os mortos e muitos mais
feridos.
Os
portugueses aplicam o verbo «fazer» para tudo e para nada e depois “fazem” as
coisas mais mirabolantes que, depois de bem espremidas, de pouco ou nada servem
e são perfeitamente dispensáveis.
Os
estrangeirismos são outra praga da nossa língua, (e mais uma vez os maus
exemplos partem, invariavelmente, quase sempre de cima), que os portugueses
teimam em adoptar, como que querendo demonstrar uma cultura acima da média,
mais não passando de pobres coitados que nem sequer são capazes de preservar o
que mais e melhor define a nossa identidade de povo e nação, que é a Língua
Portuguesa.
Podem
argumentar que foi assim que a língua portuguesa se fortaleceu, que foi na
diversidade que se enriqueceu acrescentando-lhe novos vocábulos, mas
substituir, sem necessidade, palavras que fazem parte do nosso vocabulário por
uma amálgama de palavras estrangeiras, é diversidade a mais que levará, a
prazo, ao desaparecimento da nossa identidade e da nossa cultura como nação.
Pegando na conclusão duma crónica publicada no
“Público” de 04/01/2000, “(…) confesso que não me agrada a ideia de que, por
força da força homogeneizadora da televisão, cada vez mais portugueses sejam
«colonizados» (…)” por esta maneira de falar, “(…) e mais preocupado
ainda fico quando penso que nessa altura provavelmente teremos de falar em
inglês para nos entendermos (…)” não com os espanhóis ou brasileiros como
escrevia o cronista, mas entre nós, portugueses!