Vivemos atualmente um momento histórico em
consequência da Pandemia do COVID-19, um dos sete coronavírus humanos,
considerado inicialmente um surto, e que de epidemia, evoluiu depois para
pandemia.
Identificado pela primeira vez na cidade de Wuhan,
capital da província de Hubei, na China, no início de dezembro, do ano passado,
os primeiros casos desta doença só foram divulgados no último dia do ano.
Um mês depois, em 30 de janeiro deste ano, a OMS declarou
que este surto «constitui uma Emergência de Saúde Pública de Importância
Internacional», e, embora já
estivesse difundido pelos cinco continentes, só o considerou como Pandemia a 11
de março de 2020.
Presentemente, em termos
mundiais, o número de casos ronda os 2,4 milhões de infetados, 537.000 curados
e 167.000 mortes registadas. Na Itália o número de vítimas já ultrapassa o
número ocorrido na China, país onde o surto surgiu pela primeira vez.
Foram confirmados no dia 2
de março os primeiros casos em Portugal, de início no norte, espalhando-se
rapidamente por todo o território nacional, incluindo Madeira e Açores.
O termo epidemia provém da fusão dos termos gregos epi, que significa “sobre” e demos que significa “povo”, ou seja,
algo que se derrama pela população causando alarme e medo.
A Pandemia é considerada como o pior dos cenários para
a saúde humana. Também de origem grega, esta palavra é a união de pan que significa “tudo ou todos” e demos que, como se refere acima,
significa “povo”. Caracteriza-se quando a doença, em fase epidémica, se
generaliza pelos indivíduos localizados nas mais diversas regiões, como um
continente ou mesmo todo a planeta.
Temos como exemplos mais recentes, em 2009, quando a
Gripe A passou de Epidemia a Pandemia, após a OMS ter verificado existirem
casos desta doença espalhados em todos os continentes, assim como aconteceu com
a SIDA.
Desde os tempos mais remotos têm existido episódios de
epidemias e pandemias por todo o planeta, com números elevadíssimos de vítimas
e consequências nefastas, quer a nível social, quer económico ou político.
A maior pandemia de que temos conhecimento na
antiguidade ocorreu entre 430 a 427 a.C., durante a guerra do Peloponeso,
apelidada de Peste de Atenas, Praga de Atenas, ou a Peste de
Egipto, tendo vitimado dois terços da população daquela cidade. Originada
na Etiópia, espalhou-se rapidamente pela população, que estava confinada pelo
cerco das tropas espartanas.
Em 250 a.C. surgiu a Peste de Cipriano,
nome atribuído em reconhecimento ao bispo de Cartago. De origem desconhecida
pensa-se que tenha começado na Etiópia e, espalhando-se pelo norte de África,
passou o Egipto, acabando por chegar a Roma. Vitimou mais de metade dos
habitantes de Alexandria, e atingiu a Grã-Bretanha, no ano de 444, obrigando os
Bretões enfraquecidos a procurar a ajuda dos Saxões para combater os Escotos e
os Pictos.
Apesar de apelidada de “peste”, os sintomas descritos
não são mesmos dos da peste bubónica.
Na Antiguidade, “peste” era sinónimo de enfermidade
contagiosa e de elevada mortalidade.
O vírus responsável pela “Peste de Cipriano” é, ainda
hoje, um enigma. Pode ter sido uma febre hemorrágica viral ou uma gripe causada
por um vírus idêntico ao que causou a Gripe Espanhola em 1918. Estava-se na
segunda metade do século III e as ruas de Alexandria estavam pejadas de
cadáveres. A fome, a violência e os tumultos causavam estragos em toda a
cidade. A epidemia, que começou na Etiópia, alastrou pelo Egipto, ameaçando
destruir todos os habitantes de Alexandria.
A Peste Antonina, também conhecida como a Peste
de Galeno, surgiu em 165 a.C. Pensa-se que foi um surto de varíola ou
sarampo, que afetou de início os Hunos e acabou por alastrar a todo o Império
Romano. Marco Aurélio, apesar de se lhe ter atribuído a morte a causas
naturais, presume-se que tenha sido vítima desta doença.
Considerada como a primeira pandemia historicamente
documentada, a Praga de Justiniano ocorreu entre 541 e 750 da
nossa era, e foi o primeiro caso de peste bubónica que vitimou aproximadamente
50 milhões de pessoas, ou seja, mais de metade da população europeia. Com
origem no Egito, generalizou-se pelo Império Bizantino (no tempo do imperador
Justiniano I “o Grande”) chegando até ao Mediterrâneo.
No século XI, a Lepra, também conhecida como a
doença de Hasen, devastou a Europa. Esta doença era, na idade média, encarada
como um castigo divino, considerando-se que os doentes tinham sido
amaldiçoados.
Aquela que veio a ser considerada como a maior
pandemia da história da nossa civilização, a Peste Negra ou Peste
Bubónica, iniciou-se em 1347 na Ásia Central, devastando a Europa, em
consequência da falta de saneamento, dizimando entre 25 a 75 milhões de
vítimas.
Em consequência da colonização de alguns países por
outros mais desenvolvidos, doenças inexistentes em alguns continentes evoluíram
para pandemias, exemplo: varíola e sarampo. Quando em 1496 Cristóvão Colombo
chegou à América, os Tainos, povo indígena das Caraíbas, eram cerca de 60.000,
e, em 1548 eram menos de 500. O sarampo e a peste negra são responsáveis pela
morte de cerca de 90% da população. O império Asteca foi dizimado por um surto
de varíola.
Em 1665 Londres foi assolada pela peste bubónica,
conhecida como a Grande Peste de Londres, que causou a morte a cerce de
20% da população. No ano seguinte Londres foi abalada por um grande incêndio,
quando ainda estavam a recuperar da trágica peste.
O vírus da Gripe, em 1580, na Ásia, deu origem às
primeiras notícias de pandemias. Em 6 meses o vírus espalhou-se pela Europa,
África e, mais tarde, pela América do Norte, matando cerca de 10% da população
nas zonas afetadas.
Em 1729, a Gripe voltou a atacar na Rússia,
tornando-se pandémica. Alastrou depois, em 1732, por todo o mundo dizimando, em
36 meses, cerca de 500 mil pessoas. Na China ocorreu outra pandemia (1781), que
veio infetar a Europa em 6 meses, e, em 1830, nova pandemia de gripe,
inicialmente na China, infetou cerca de 25% da população, ao passar pela Ásia,
Europa e Américas.
Além da gripe, outras doenças deram origem a
pandemias, como a cólera, que nos trouxe 8 grandes pandemias que afetaram o
mundo inteiro.
- A primeira Pandemia de Cólera (1816) da série,
terá começado na Índia, alastrando pela China até à república do Azerbaijão,
Cazaquistão, Turquemenistão e Rússia, espalhando-se posteriormente pelo mundo.
Vitimou à volta de 150.000 pessoas.
- A cólera teve início na Europa em 1832, alastrando
para a Inglaterra, Estados Unidos e Canadá.
- Aquela que terá sido a Pandemia de Cólera mais
devastadora de sempre, surgiu em 1852 e devastou a Rússia, causando mais de um
milhão de mortes.
- Entre 1863 e 1875 expandiu-se rapidamente pela Europa
e África.
- Em 1866 a América do Norte é fortemente contaminada.
- A cólera atingiu principalmente a Alemanha, em 1892,
causando mais de 8.000 mortes no país.
- A Rússia é particularmente atingida pela cólera em
1899 mas, com o avanço da saúde pública, a Europa pouco é afetada.
Uma nova vaga de Peste Bubónica teve início na
China em 1855 e espalhou-se com rapidez pela Índia, atingindo Hong Kong,
estimando-se que tenha vitimado 15 milhões de pessoas e que só tenha sido
extinta em 1960.
Uma epidemia de sarampo na Austrália acabou por virar Pandemia
de Sarampo nas Ilhas Fiji (1875). Estas ilhas eram colónias britânicas,
cujo chefe Ratu Cakobau veio infetado após o regresso de uma visita àquele
continente, acabando por disseminar esta doença. Morreu um terço da população
das ilhas, 40 mil pessoas.
A Gripe Russa apareceu em 1889. Uma Pandemia
que começou na Sibéria, alastrou ao Cazaquistão e se difundiu pela Europa,
América do Norte e África. Em 1890 tinha já provocado cerca de 360.000 mortes.
Desconhecesse-se a origem geográfica da Gripe
Espanhola, Gripe Pneumónica, Peste Pneumónica ou apenas Pneumónica,
pandemia que apareceu em 1918, espalhando-se pelo mundo até ao ano seguinte.
Esta designação de “Gripe Espanhola” deve-se ao facto
de ter aparecido no auge da Primeira Grande Guerra, na qual estavam envolvidas
as grandes potências mundiais. De um lado os aliados, Grã-Bretanha, França,
Império Russo e os EUA, e do outro a Alemanha e Áustria-Hungria. Os países em
confronto tentavam a todo o custo suster informações sobre a doença, para
evitar o desânimo na sua população com notícias sobre grande número de civis
doentes ou a morrer.
Como país neutral, a Espanha não necessitava de
ocultar a informação, e noticiava “a
informação completamente errónea” de que tinha sido o foco da doença e que
a sua população era a mais castigada.
A primeira
notícia sobre esta doença apareceu no jornal espanhol El Sol a 22 de maio de 1918.
São várias as suposições aonde terá começado. Para uns,
esta pandemia terá tido o seu início e sido espalhada depois a partir de um
acampamento militar no Kansas (Estados Unidos), entre os militares que mais
tarde viajaram para a Europa, outros, tendem a admitir que se terá iniciado a
partir da base militar de Etables, no norte da França, outros ainda, admitem
que terá sido disseminada através dos soldados indochineses que lutaram em
França entre 1916/1918.
A guerra existente terá sido a consequência do grande
desenvolvimento desta doença. A concentração de milhões de soldados criou as
condições necessárias para o desenvolvimento de estirpes de vírus mais agressivos
e facilitou a sua propagação pelo mundo, infetando cerca de um terço da
população mundial, sendo a doença infeciosa que causou o maior número de
vítimas. Pelo período de um ano terá causado a morte a cerca de 5% da
população, à volta de 50 a 100 milhões de mortes em todo o mundo, e entre 50 a
70 mil em Portugal, entre 1918/19.
Considerada a maior pandemia mundial conhecida até
hoje, a Gripe Espanhola causou mais mortes que a Peste Negra ao
longo de vários séculos, quase três vezes mais que o números de mortes na
Primeira Grande Guerra, contagiando cerca de 500 milhões de pessoas e matando
mais em 25 semanas do que a SIDA em 25 anos, tendo sido 25 vezes mais fatal,
quando comparada com outros vírus idênticos.
Os primeiros casos da gripe pneumónica em Portugal
sucederam em maio de 1918, dizimando em dois anos 59.000 de pessoas, com uma
taxa de mortandade de 9,8%, ultrapassada penas, na Europa, pela Espanha, Itália
e Hungria.
O Dr. Ricardo Jorge, diretor-geral de então no sector
da saúde, liderou o combate à doença, ao ser nomeado comissário-geral do
governo na luta contra a epidemia. Um pouco à semelhança da situação atual, as
escolas foram encerradas, proibidas as feiras e romarias, e, como medida
profilática, a população foi aconselhada a lavar as mãos com frequência e
cobrir a boca e o nariz ao espirrar. Dezenas de espaços públicos foram
disponibilizados como enfermarias e, face ao grande número de vítimas ao longo
de várias semanas, viveram-se situações de verdadeiro caos.
A Gripe Asiática, surgiu em fevereiro de 1957
como uma das maiores epidemias de gripe. O seu início foi no norte da China,
expandindo-se o vírus rapidamente e atingindo, em cerca de 2 meses, Singapura e
Hong Kong, disseminando-se a partir daí para a Austrália, Índia, África, Europa
e os Estados Unidos. Em cerca de 10 meses estava presente em todos os países.
No dia 7 de agosto, através do desembarque de passageiros vindos de África no
navio “Moçambique”, esta gripe entrou em Portugal. Em todo o mundo 1,1 milhões
de pessoas foram vítimas desta Pandemia.
A Gripe de Hong Kong surgiu em julho de 1968
onde foi detetado o primeiro caso, vindo a causar impacto na Guerra de
Vietname, ao ser levada para os Estados Unidos, disseminando-se o vírus
rapidamente pelo mundo. Ao fim de 3 meses estava na Europa, Austrália, Índia e
Filipinas, matando cerca de 1 milhão de pessoas. Só em Hong Kong foram 500 mil,
15% da sua população.
O VIH/SIDA veio em 1981. A sua disseminação aumentou
rapidamente nos EUA no início dos anos 80. Identificada a sua origem em
chimpanzés, em África, mais de 35 milhões de pessoas foram vitimadas por esta
doença. Os avanços da medicina permitem aos pacientes o controlo da doença, mas
ainda não a sua cura.
Inicialmente designada de gripe suína, nova Pandemia
de Gripe surgiu em 2009, depois rotulada de Gripe A em abril desse
ano. Foi um surto inicial duma variante de gripe suína acorrida no México, em
março, e que veio a atingir a Europa e a Oceânia. Esta Pandemia de gripe
causada pelo vírus H1N1, vitimou 203 mil pessoas em todo o mundo devido a
problemas respiratórios, afetando principalmente as pessoas mais novas (5 a 24
anos) e as populações dalgumas regiões do continente americano.
Estudos indicam que o número de mortes em países como
a Argentina, Brasil e México, foi 20 vezes maior que países menos atingidos,
como a Nova Zelândia, Austrália e grande parte da Europa.
Através de várias campanhas de vacinação, estamos hoje
melhor preparados para enfrentar uma nova pandemia, face aos progressos nas
tecnologias de comunicação que nos permitem uma reação mais rápida à ameaça de
uma nova contaminação.
Temos hoje à nossa disposição novos recursos que nos
podem ajudar a prever o avanço do contágio por um vírus. É o caso de
termómetros inteligentes ligados à internet, cujas medições permitem detetar o
seu início em qualquer local do mundo, de simulações computorizadas e de
inúmeros medicamentos disponíveis. Apesar disto, no mundo global em que
vivemos, um vírus pode generalizar-se mais facilmente e surpreender-nos pela
sua resistência às terapias existentes ou gerar mutações, criando novas
variantes, contagiando outras espécies, incluindo o ser humano, tornando, por
isso, necessário desenvolver rapidamente novos medicamentos capazes de os
destruir.
Outras doenças como o Ébola, o Zika, o Dengue
e o Chikungunya, são patologias de preocupação mundial pela sua enorme
facilidade de contaminação e que podem dar origem a grandes pandemias, sendo
objeto de estudo intensivo por parte da comunidade científica. Alguns
investigadores e cientistas, assim como especialista em doenças infeciosas
David Quamen, afirmam que com o corona vírus controlado, o mundo precisa de se
preparar para a próxima pandemia, pois, mais tarde ou mais cedo, novos surtos
pandémicos surgirão.
A “Campanha pela Natureza” do National Geographic
afirma que no futuro haverá mais doenças com o COVID-19, em consequência de
vários fatores, entre os quais a contínua desflorestação e a conversão de
animais selvagens em animais de estimação, em alimentos ou em medicamentos, ao
mesmo tempo, que para vários ambientalistas, o aumento do risco de contrair
novos vírus se deve ao aumento da população em todo o mundo.
É importante que sejam tomadas medidas urgentes e se
criem novos regulamentos com a finalidade de protegermos o planeta, e muitos
investigadores alertam-nos para isso.
Referências:
Gripe pneumónica, a pandemia de 1918-19
Principais pandemias
Centenário da Gripe Espanhola, que de Espanha só tem o
nome
Pandemia de gripe de 2009 matou mais pessoas do que se
pensava
Revisitando a espanhola: a gripe pandémica de 1918 no
Rio de Janeiro
A praga de Cipriano, a estranha epidemia que causou a
queda de Alexandria
A epidemia pneumónica em Portugal no seu tempo
histórico
A medicina e a influenza espanhola de 1918
Sem comentários:
Enviar um comentário